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O MAL-ESTAR NA CIVILIZAÇÃO
"A felicidade humana, por conseguinte, parece não ser a finalidade do universo, e as possibilidades de infelicidade realizam-se mais prontamente. Essas possibilidades estão centralizadas em três fontes: o sofrimento físico, corporal; perigos advindos do mundo exterior e distúrbios ocasionados pelas relações com outros seres humanos - talvez a fonte mais penosa de todas." Sigmund Freud
Análise e Reflexão
Em seu livro, "O Mal-estar na Civilização", Freud nos faz perceber que o indivíduo não pode ser feliz em sociedade, por mais avanço tecnológico e científico que tenhamos, como atualmente ocorre, tanto que não favoreceu para que o homem se tornasse mais feliz e tivesse mais prazer.
Fica claro que o propósito de vida civilizada não é a felicidade pelo prazer, mas sim pelo afastamento do desprazer, ou melhor ainda, a felicidade é de fato não passar pelo desprazer. Procuramos constantemente nos realizarmos através da satisfação do prazer, mas isso é impossível de conseguir numa civilização que é contrária as necessidades humanas.
Em tudo que é bom e prazeroso existe em contrapartida a necessidade de trabalho penoso e sofrimento. Instintivamente o homem não é adepto ao trabalho, mas é através da repressão social que o homem é obrigado a trabalhar.
Conforme a teoria de Freud a sexualidade é ponto fundamental na manutenção e reprodução da civilização. Somente por que os impulsos sexuais são canalizados para o trabalho que a civilização pode existir. Tanto é assim que Freud colocou a “culpa” na repressão sexual que a sociedade de sua época mantinha sobre os impulsos sexuais, ocasionando assim muitos distúrbios psíquicos.
Diante disso é possível entender que o mal-estar na civilização, corresponde ao processo civilizatório que exige renúncia e portanto insatisfação. Ocorre um conflito entre as restrições da civilização e as exigências pulsionais, que acaba sendo impossível de ser coordenado conjuntamente. É isso o que Freud fala sobre o que é o Mal-Estar na Civilização.
Ao fazer uma reflexão com a época de Freud e a nossa, podemos dizer que hoje as coisas são muito melhores em vários aspectos, como por exemplo, o aumento da expectativa de vida, o saneamento básico e principalmente a liberdade sexual.
E mesmo assim o mal-estar não desapareceu. Hoje o mal-estar tem um novo perfil que está mais associado ao modernismo, como o desemprego, a fome, a instabilidade, etc. São todos fatores que geram insegurança no individuo e que ocasionam as doenças psíquicas da nossa época, depressão, síndrome do pânico, baixa auto-estima, entre outras.
É a preocupação, o medo, a insegurança, que atualmente é o mal-estar na civilização. Na época de Freud o puritanismo e o controle rígido dos impulsos sexuais eram motivo para se dizer que o mal-estar surgia das restrições sexuais.
Mas autalmente a liberdade sexual impera em toda parte e de todos os modos e me parece que esse já não é o fator primordial para as crises de ansiedade e das neuroses. Com o desenvolvimento técnico e científico o uso das pulsões sexuais na produção de trabalho perdeu a sua necessidade.
O individuo não precisa mais deixar de lado sua sexualidade em nome do desenvolvimento. Não é mais necessário desviar as pulsões sexuais para o trabalho e a cada dia essa exigência cai mais e mais, até o ponto de não ser mais preciso no futuro. Sendo assim as pulsões estariam livres da repressão imposta pelo trabalho social.
Dessa forma, o mal estar do indivíduo na civilização não surge mais de uma tensão física, sexual, que causa a ansiedade, mas é uma tensão psíquica, causada pela preocupação, pelo medo e pela insegurança causada por condições econômicas e sociais, que geram doenças que não eram muito comuns na época de Freud, doenças típicas de nossa época e que estão associadas ao mal estar na civilização.
Na época de Freud os valores eram bem estabelecidos, hoje não há mais valores a serem seguidos. A família que é formadora da individualidade tornou-se frágil por causa das exigências sociais e econômicas, ela não é mais um núcleo. Todos os indivíduos devem trabalhar se querem viver.
A criança não tem mais o convívio dos pais. Eles deixaram de ser um modelo, não há mais parâmetros. São as instituições sociais que formam o indivíduo. O indivíduo moderno está desamparado e desorientado. O distanciamento da autoridade dos pais causou ao indivíduo a desorientação e a insegurança frente ao mundo.
O mal-estar na civilização é a condição do homem moderno, é o destino que todos temos. O simples fato de vivermos no mundo contemporâneo já é motivo para se viver ansioso. A competitividade, o consumo exagerado, o desemprego, a violência, são alguns dos principais fatores que produzem o mal-estar na civilização.
O homem não é por natureza gentil, pelo contrário seu instinto é da agressividade. Ao pensar nisso, seu próximo passa a ser potencialmente um objeto onde seus instintos serão projetados. Socialmente isso não é aceitável, tanto que o que Freud diz é que a pulsão de morte é o maior perigo a civilização.
Para controlar e reprimir a agressividade humana dirigida ao seu próximo, a identificação e a sua internalização, faz com que ocorra um desvio da agressividade que seria dirigida para fora, se voltar para dentro de cada um dos seres humanos. Esse processo estabelece o sentimento de culpa, uma das formas de apaziguar essa culpa é através da religião.
O sentimento de culpa seria o mal-estar da cultura, o preço de vivermos em sociedade, reprimindo a sexualidade e a agressividade. Pensando assim, podemos dizer que o mal-estar é estrutural, próprio dos processos de organização do psiquismo do homem.
A existência humana é problematizada por não ser mais natural, quero dizer, que as leis da natureza são substituídas pelas leis da cultura. Se por um lado a civilização provoca um mal-estar, por outro lado sem civilização não haveria humanidade.
Portanto, uma certa alienação e busca da felicidade através de pequenos momentos de prazer é um mal-estar necessário.
Comentários | Nossos leitores já fizeram 4 comentários sobre este artigo: | De: Neuza Pereira De Almeida (em 14/08/2016 - 14:03) | O MAL ESTAR DA CIVILIZAÇÃO... Amei a síntese: o homem é perveso, não se respeitam, não equilibram seus pensares e nem seus atos , são afoitos, fortes, bravos, sempre viril ,quando se juntam a outros se desconectam da realidade, teremos que aprender a pensar, como disse a Susana Silva. | De: Susana Silva (em 25/07/2013 - 19:41) | Mal estar-Civilização Resumindo: é difícil estar bem e manter esse bem-estar em qualquer civilização, em qualquer tempo. Cada indivíduo é produto e produtor da civilização atual ou vindora. Há e haverá sempre conflitos. É um processo de re-equilibrio e re-armonização constantes que passa tambem pelo autoconhecimento, consciencia e mudança. Somos uma obra inacabada e o que podemos fazer, a meu ver, é continuar a construção aprendendo a pensar e a posicionar-se de uma forma nova e construtiva.Ajustamo-nos e adaptarmo-nos para reduzirmos o nosso desconforto e canalizarmos as nossas energias para gerar realidades satisfatórias...simplificamos...e a cada dia tentando gerar mais equilibrio, mais bem estar. Eu pensava que o Homem era naturalmente gentil e que por influencias ou fatores externos poderia tornar-se mais ou menos agressivo conforme conseguisse ou não gerir sua agressividade... | De: Luiz Henrique de Albuquerque Bicalho (em 23/07/2013 - 18:23) | O mal estar na civilização. O título já inicia a resposta a esta questão, "estar mal na civilização", concordo somos agressivos e mais próximos do homem das cavernas do que pensamos. A religião como fator de culpa está relacionada mais a cultura do pecado presente na culpa judaico cristã e suas congêneres. O sexo ainda que muito falado e feito ainda é motivo de muita desavença, seja pelas diferenças de gênero como pela posse, sou mais pela linha da criança de hoje, sem limites claros, sem aquilo que Hélio Pelegrino dizia: "O amor é o chão da liberdade", ou seja a criança amada e cuidada tem maior resistência a frustrações pela vida afora e capaz de saber com maior clareza que a vida é feita de momentos, sabendo se cuidar para poder se aproximar do próximo, afinal somos todos essencialmente sozinhos e estabelecemos relações para termos o espaço do aconchego que nos torna menos sozinhos. E em tempo, consumir não é ser, e se você está sozinho e não se sente bem, você não está em boa companhia. Ah, e sexo é uma delícia, desde que se saiba pratica-lo com a pessoa que você escolheu e que goste também. Sou mais pela constância na relação do que ficar pulando de galho em galho, sexo se aprimora e com o tempo se descobre o que nos dá prazer e o que a parceira escolhida goste também. Olhar empático ajuda e menos projeção também, se não tudo deixa de ser pessoal e resta apenas um espelho, provavelmente narcísico rsrsrsrs | De: ANTENOR JOSÉ DA SILVA (em 17/03/2013 - 20:46) | O mal estar na civilização Ótima síntese, gostei muito e ajuda no entendimento desse livro do Freud, valeu, grato, Antenor. | INCLUA UM COMENTÁRIO SOBRE ESTE ARTIGO• Para postar o comentário é necessário ser . |
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